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Quasicristais: uma nova classe de sólidos

Fauller Henrique da Fonseca

Todo mundo já ouviu falar de cristais, mas nem todos sabem qual a definição científica dessa palavra. Segundo a antiga definição da cristalografia, cristal é uma substância na qual os átomos, moléculas ou íons que a compõe estão “empacotados” em um padrão regularmente ordenado e de repetição tridimensional. Porém, em 1992, essa definição passou por uma alteração devido a uma descoberta realizada por Dan Shechtman em 1982, os quasicristais. Trata-se de materiais que, como os cristais, também são formados por arranjos ordenados de átomos, que possuem um padrão, porém com a diferença de que esse padrão não segue uma ordem de repetição periódica.

Nessa época, Shechtman trabalhava como professor-assistente no Instituto Tecnológico Technion, em Israel. Numa manhã, enquanto observava uma liga de manganês e alumínio ao microscópio eletrônico, Shechtman obteve um padrão de difração que indicava um índice de simetria rotacional de ordem 10 (36˚). O resultado surpreendeu-o, pois até então admitia-se que cristais só poderiam apresentar simetrias de rotação de ordens 1, 2, 3, 4 ou 6 (ângulos de 360˚, 180˚, 120˚, 90˚ e 60˚, respectivamente). Shechtman sabia que outros pesquisadores já haviam obtido resultados parecidos com o dele, mas a maioria deles acabava por abandonar o trabalho devido ao paradigma já estabelecido. Porém Shechtman seguiu adiante com suas pesquisas. Na década de 1990, foram criados diversos grupos para estudar estes novos materiais.

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(a) Padrão de difração* obtido por Daniel Shechtman. (b) Sobre o padrão de difração, estão assinalados os círculos concêntricos contendo 10 pontos cada um e figuras com simetria de ordem 5. A razão entre os raios dos círculos adjacentes é de aproximadamente 1,6. *foto obtida no sítio da Fundação Nobel: http://www.nobelprize.org/nobelprizes/chemistry/laureates/2011/infopubleng2011.pdf

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Caderno de anotações de Daniel Shechtman mostra pontos de interrogação ao lado dos dados: o próprio cientista se surpreendeu com os resultados (Foto: Reprodução)

Continuou-se o trabalho durante dois anos e, com o apoio do professor Ilan Blech, publicou o primeiro artigo sobre sua descoberta na revista “Physical Review Letter”. Com a aprovação de Shechtman, os físicos Dov Levine e Paul Steinhardt publicaram também um artigo, no qual o termo “quasicristais” foi utilizado pela primeira vez, visto que o conceito de cristalinidade era insuficiente para explicar a essência destes materiais. Como previsto, alguns membros da comunidade científica não se convenceram do trabalho de Shechtman, entre eles Linus Pauling, que chegou até mesmo a escrever uma carta para a revista “Nature”, dizendo não acreditar nos resultados obtidos por Shechtman. Após a morte de Pauling, em 1994, os quasicristais foram sendo mais reconhecidos, já que a comunidade científica passou a levar mais em conta os feitos de Shechtman. Na década de 1990, foram criados diversos grupos para estudar esses novos materiais.

Enfim, em 1992, a União Internacional de Cristalografia alterou a concepção de cristais, que passou a ser a seguinte “qualquer sólido que tenha um diagrama de difração essencialmente discreto”. Esta definição, além de incorporar os quasicristais, abre espaço para novos tipos de materiais que possam ser descobertos. Os estudos de Dan Shechtman lhe renderam o prêmio Wolf, no ano de 1999, e o Nobel de Química, no ano de 2011.

Aplicações

Desde que os quasicristais foram descobertos, muito se estudou sobre eles e, inclusive, sintetizou-se vários deles em laboratório. Uma empresa sueca criou um aço inoxidável muito resistente, que vem sendo utilizado em lâminas e agulhas cirúrgicas. Alguns quasicristais vêm sendo utilizados como isolantes térmicos, antiaderentes e em materiais termoelétricos.

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Algumas das aplicações dos quasicristais, atualmente. Fonte: g1.com.br

 

Referências